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Problemas no Império Português

"É da essência orgânica da nação portuguesa desempenhar a função histórica de possuir e colonizar domínios ultramarinos e de civilizar as populações indígenas que neles se compreendam". Nesta frase, que consta do Ato Colonial de 1930, encontramos os fundamentos da ideologia imperial do Estado Novo. A Nação tinha, pois, a missão histórica de descobrir, possuir e colonizar os territórios, o que pressupõe uma conceção do mundo que conferia a Portugal a tutela sobre os indígenas desses territórios, isto é, e em resumo, a primazia da civilização europeia.
A posse e administração de tão vastos territórios - relativamente à área da metrópole, Angola era 14 vezes maior e Moçambique 9 - com populações num estado civilizacional tão diferente e falando diversas línguas, não se revelava tarefa fácil, tanto mais que o Portugal dessa época era pobre e escasso de recursos. Isto, aliás, se pode deduzir do texto do Relatório que antecede o Ato Colonial, relatório esse que enuncia assim as razões que levaram à sua elaboração:
" ... c) Criação do conceito de Império Colonial Português, formado pelos domínios de Portugal ligados à metrópole por laços de solidariedade moral e política;
d) Defesa da soberania portuguesa nas concessões coloniais, sendo-lhe vedado delegar em empresas particulares quaisquer funções de soberania, reservando-se para o Estado o direito de administrar e explorar os portos comerciais das colónias;
e) Definição dos princípios gerais de uma política indígena que visa proteger e defender os indígenas, obstar ou castigar os abusos cometidos contra eles, criar ou promover instituições para os patrocinar ou para lhes valer, remunerar os que forem empregados nas suas obras, proibir os regimes pelos quais tomem o compromisso de os fornecer para serviço de empresas e estribar o contrato de trabalho na liberdade individual e na garantia de justo trabalho ou assistência, com a sua fiscalização;
f) Afirmação de que o Estado promulgará estatutos especiais para os indígenas, ressalvando os seus usos e costumes;
g) Aceitação e proteção às missões religiosas portuguesas como agentes eficazes de civilização e soberania; ..."
De todo este conjunto de princípios se conclui que as ligações políticas entre a Metrópole e África estavam mal definidas; que havia empresas comerciais que, face à fraqueza do Estado, desempenhavam parte das funções deste (situação, aliás, que se irá manter até 1974, como nas áreas concessionadas à empresa Diamang); que havia negros a trabalhar sem receber remuneração (a escravatura, aliás, ainda era mais do que uma recordação); que era inviável sujeitar os negros às mesmas leis que governavam os brancos; que em muitas terras a única presença branca era a de um missionário.
Com o final da Segunda Guerra Mundial dá-se a crise no sistema colonial europeu, com o aparecimento, reforço e intensificação dos movimentos nacionalistas na Ásia e depois na África, e com a falência das ideologias baseadas na hierarquia racial e na superioridade da civilização europeia.
Em 1945, a Carta das Nações Unidas declarava, no capítulo I, como objetivo daquela organização, o seguinte: "Desenvolver entre as nações relações amigáveis fundadas no respeito pelo princípio da igualdade de direitos dos povos e do seu direito de disporem de si próprios e tomarem quaisquer medidas apropriadas à consolidação da paz no mundo (...)". Em 1960, uma resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas proclama expressamente o direito dos povos coloniais à independência, e nomeia os territórios do Ultramar português como colónias.
As potências europeias vão procurar adaptar-se ao novo contexto através da concessão de uma progressiva autonomia aos seus territórios do Ultramar - um processo que conduziu em poucos anos à descolonização quase total da Ásia e da África.
Esta descolonização, especialmente nos casos da França e da Inglaterra, foi feita de modo a manter o máximo de ligações culturais e económicas com as antigas colónias. No caso português, isto seria mais difícil, face à fraca força empresarial do país. Por outro lado, a importância das colónias para a ideologia nacionalista dificultava também o encarar de soluções que levassem à descolonização. Isto explicará o imobilismo do Estado Novo que se manteve sempre nas mesmas posições quanto à questão colonial, seja depois da Segunda Guerra Mundial, seja após a Conferência de Bandung, seja depois do início do processo de descolonização de África nos finais dos anos 50, não dando resposta aos pedidos de diálogo dos movimentos de libertação que se formaram nas distintas colónias portuguesas naquela década.
Os apoios internacionais, ao nível de treino militar, doutrinação política, fornecimento de material de guerra e apoio político, quer dos países do Bloco de Leste, quer dos países recém-chegados à independência, especialmente os africanos, possibilitaram e facilitaram o aparecimento de movimentos de guerrilha. Todo este processo histórico se vai passar, não o esqueçamos, no período da "guerra fria", no qual as "grandes potências" vão, por interposta pessoa, tentar alargar as suas esferas de influência, com o que surgem por vezes guerras regionais.
GOA, DAMÃO E DIU
Neste contexto, o primeiro caso que se coloca a Portugal são as reivindicações da União Indiana que se iniciam logo a partir de 1947, ano da sua independência plena. O nacionalismo indiano triunfou primeiro sobre a ocupação inglesa, e, depois, em 1956, virou-se contra os Franceses, exigindo que estes abandonassem os territórios que aí possuíam. Finalmente, a mesma exigência foi posta ao Governo português, que ocupava os territórios de Goa, Damão e Diu.
O objetivo do Governo da União Indiana, presidida por Nehru, era integrar o Estado português da Índia nos seus domínios. Salazar, por seu lado, só queria adiar o problema. As autoridades portuguesas consideravam que "a evolução política da Índia Britânica nada tinha a ver com o destino da Índia portuguesa".
As negociações prolongaram-se durante algum tempo até que o Governo português decidiu que não iria ceder a tais pressões e encerram-se as relações diplomáticas em junho de 1953. As hostilidades iniciaram-se com o incidente de Dadrá e Nagar-Aveli. Estes dois enclaves, situados entre Damão Litoral e o território da União Indiana, foram ocupados por forças pró-indianas em julho de 1954. O Estado português recorreu ao Tribunal Internacional de Justiça, sediado em Haia. A sentença foi dada em 1960 e reconhecia o direito de passagem a pessoas, mercadorias e funcionários civis entre Damão e os referidos territórios mas, contudo, não era clara do ponto de vista da consagração do Direito Português. Seguidamente, indianos desarmados tentaram invadir o território, tendo no entanto sido impedidos pelas forças portuguesas. Finalmente, o Governo da União Indiana recorre à força: à meia-noite do dia 18 de dezembro de 1961 os seus poderosos meios militares entraram nos territórios portugueses. Às tropas portuguesas ainda foi ordenado que resistissem pelo período de oito dias, mas a desproporção das forças era de tal ordem que as tropas portuguesas desistiram sem que tivesse existido luta prolongada: é a perda de Goa.
ANGOLA
Em Angola a guerra inicia-se em fevereiro de 1961, com o assalto à cadeia de Luanda, por um grupo de nacionalistas. Em março, grupos armados da UPA (União dos Povos de Angola), aproveitando os apoios da recém-criada República do Congo, assolam todo o território do Norte de Angola (região produtora de café), chacinando um número considerável de colonos e suas famílias.
Salazar reagiu e, após ter esmagado a tentativa golpista do general Botelho Moniz, que ficou conhecida por "Abrilada", decidiu enviar tropas para o local "rapidamente e em força".
A repressão aos autores dos massacres de colonos e populações negras oriundas do Sul, que aí trabalhavam na exploração de café, foi, segundo o regime, "uma operação de polícia", propagandeada como uma operação rápida. Na verdade, rápido foi o aumento de soldados portugueses em Angola.
Grupos de "terroristas" (como eram designados pelo Governo português), geralmente na casa das dezenas de homens, mais ou menos fardados e escondendo-se no capim, atacavam de surpresa com espingardas, metralhadoras e bazucas as colunas ou acampamentos militares, e minavam as estradas e "picadas" (caminhos no mato), com o que dificultavam as comunicações e provocavam ferimentos nos membros inferiores, que tinham de ser amputados. As tropas portuguesas, deslocando-se de camião, a pé ou de helicóptero, para fugir às minas, usavam armas semelhantes, embora também recorressem à aviação. Nas zonas de guerra concentrava-se a população em determinados "aldeamentos", de modo a melhor controlá-la e assim impedir o seu apoio aos "turras" (designação dada aos "terroristas" pelos soldados), abrigando-os ou fornecendo-lhes bens e alimentos. Nessas zona, as populações que ficavam fora dos aldeamentos eram consideradas "inimigas".
A frente do Norte foi, no decurso dos primeiros anos da guerra, dominada pela UPA. O MPLA abre, em 1963, uma nova frente em Cabinda e, três anos volvidos, outra em Saliente do Cazombo, no Leste angolano. A UNITA, fundada em 1966, após alguns anos de combate, opta por uma via colaboracionista.
Deve, entretanto, dizer-se que, malgrado o "terrorismo", Angola atravessou nos anos da guerra um brilhante período de progresso económico, social (traduzido, por exemplo na abolição do Estatuto do Indígena, pois a necessidade de captar simpatias entre a população negra tal exigia) e educativo, com a criação dos "Estudos Gerais" (mais tarde Universidade) de Luanda logo em 1962.
GUINÉ E CABO VERDE
Após o massacre e repressão dos trabalhadores de Pidjiguiti, o PAIGC (Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde), dirigido por Amílcar Cabral, iniciou, em 1963, as suas operações militares.
Seria na Guiné que as tropas portuguesas teriam mais dificuldades. O PAIGC tinha o apoio da Guiné-Conakri e do Senegal e desenvolveu a guerrilha num terreno onde a presença portuguesa era escassa, as deslocações difíceis (o terreno na Guiné era muito alagadiço) e o clima desagradável. Logo no início, os guerrilheiros conseguiram instalar-se em áreas nas quais as tropas portuguesas só raramente entravam. Nos anos 70, começam a usar mísseis de terra-ar Strela (soviéticos), o que levou a uma paralisia quase total da aviação militar portuguesa (note-se que estes mísseis só chegaram a Portugal depois do 25 de abril). Ora, as ações militares portuguesas eram, quase sempre, apoiadas pela aviação, cujos objetivos eram não só enfraquecer as defesas inimigas, mas, e sobretudo, permitir largar tropas nos locais onde se iriam desenrolar os combates, abastecer postos isolados e evacuar os feridos. Tentava-se fugir assim, na medida do possível, às deslocações por terra que acarretavam o perigo de ataques de surpresa ou de minas, para além das dificuldades de cariz geográfico. Pode-se, por tal, avaliar a situação difícil criada às tropas portuguesas.
A situação complicava-se para os militares portugueses, apesar da ação do general Spínola, do assassinato de Amílcar Cabral e de tropas portuguesas e dissidentes guineenses terem invadido a Guiné-Conakri, tentando, em vão, instalar um governo favorável a Portugal, ou, pelo menos, a prisão dos dirigentes do PAIGC. Em setembro de 1973 foi proclamada a independência em Medina do Boé, zona libertada pelo PAIGC, logo reconhecida por variadíssimos Estados. E, nas vésperas da Revolução, mediante a hipótese da Guiné vir a usar os aviões MiG soviéticos, temeu-se a derrota militar das tropas portuguesas.
MOÇAMBIQUE
A Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique) fundada em junho de 1962, inicia, em 1964, as suas ações armadas, especialmente no distrito de Cabo Delgado, procurando depois expandir-se para sul, apesar da morte de Mondlane (vítima de uma encomenda armadilhada enviada pelas autoridades portuguesas), que fora substituído por Samora Machel no comando do movimento.
Entretanto, e tal como em Angola, os anos da guerra foram também de progresso, evidenciado pela construção da barragem de Cahora-Bassa, a maior de África, destinada a fornecer energia elétrica não só a Moçambique, mas também à África do Sul, país então governado pela minoria branca.
A guerra colonial, agora em três teatros de operações diferentes, produziu efeitos diversos no interior de Portugal. Pela longa duração e meios militares, logísticos e financeiros empregues, provocou um desgaste crescente do Estado Novo e proporcionou uma progressiva consciencialização política dos militares do Quadro Permanente, através do contacto com oficiais milicianos e do sentimento de responsabilidade caso ocorresse uma situação idêntica à que se verificou na Índia. Por tudo isto, era cada vez mais claro para a maioria da população portuguesa que não haveria vitória militar em qualquer das três frentes e que a guerra só terminaria por uma solução negociada ou com a queda do regime.
Assim, a guerra colonial foi o começo do fim do regime, pois Portugal ficou cada vez mais isolado no contexto internacional sendo inclusive abandonado pelos aliados da OTAN e pela Espanha (com a qual entrara em divergência desde 1963 aquando do último encontro de Salazar com Franco). A emigração para a Europa foi um fenómeno imparável e a partir da 62, começa a ganhar, de forma crescente, uma componente de recusa à guerra colonial, verificando-se o aumento de refratários, isto é, de mancebos que não se apresentavam à inspeção militar (no ano de 73 houve 22% de refratários) e mesmo de deserções nas vésperas da partida para África. A guerra iria causar cerca de 11 000 mortos, em números atuais (nem todos metropolitanos, pois nas fileiras encontravam-se soldados indígenas). Cerca de metade destas mortes será devida a desastres de viação. Os feridos foram cerca de 28 mil, não falando dos afetados por perturbações psíquicas.
A ditadura do Estado Novo cai em função do completo bloqueamento a que havia chegado a questão ultramarina, transformada, desde 1961, em guerra colonial.
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Como referenciar
Porto Editora – Problemas no Império Português na Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora. [consult. 2023-09-26 10:25:34]. Disponível em
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