fotografia (arte)
Processo de produção de imagens através da fixação da luz refletida pelos objetos numa superfície impregnada com um produto sensível. Apesar da importância que assumiu ao longo dos anos como meio privilegiado para a captação de imagens, dentro de todos os domínios do conhecimento, as suas possibilidades expressivas, gradualmente reconhecidas e desenvolvidas ao longo do século XX, introduziram-lhe valências estéticas que a tornaram numa das mais recentes formas artísticas no campo das artes visuais, também designadas por artes plásticas.
Século XIX
Apesar da primeira imagem fotográfica ter sido produzida em 1827, só nos finais dos anos 40 desse século o processo da fotografia foi suficientemente divulgado para se assumir como um meio dotado de possiblidades estéticas.
A consciência do seu valor enquanto meio expressivo e, logo, enquanto forma autónoma de arte, foi reconhecida pelo pintor francês Paul Delaroche que, ao ver o primeiro daguerreótipo, considerou que a pintura tinha morrido. Uma afirmação premonitória que se revelou igualmente prematura, pois seriam necessárias muitas décadas para que a fotografia fosse realmente considerada uma forma de arte, com uma linguagem própria, e não somente um processo mecânico.
As utilizações da fotografia, desde meados do século, atribuiram-lhe um carácter e uma funcionalidade essencialmente documental enquanto instrumento de reprodução direta e supostamente objetiva da realidade.
Abordando temáticas variadas que tocavam áreas como a antropologia, a etnografia, a medicina e outras ciências, assim como a divulgação de paisagens, lugares, culturas e edifícios marcantes (como o londrino Palácio de Cristal ou a Torre Eiffel) ou as grandes obras de engenharia, a fotografia provou o seu valor enquanto retrato da época, dos principais momentos políticos e sociais, dos valores sociais e das formas de vida.
Nesta altura muitos fotógrafos viajaram pelo mundo procurando culturas distantes e exóticas. John Thomson, por exemplo, tornou-se conhecido pelo conjunto de fotografias da china imperial.
Contrastando com esta dimensão pitoresca e exótica, surgiram publicamente várias séries de dramáticas imagens das diferentes guerras que eclodiram na segunda metade da centúria, de que se destacaram a Guerra da Crimeia ou a Guerra Civil Americana.
Outro tema, no entanto, rompeu com esta dimensão documental da fotografia, apontando para uma valorização mais formal que se aproximava de algumas das características expressivas da pintura: o corpo humano nu. Grande parte destas fotografias, nomeadamente as imagens alegóricas de Oscar Gustav Rejlander, seguiam as canónicas convenções formais da arte finisecular, através de rígidas encenações.
Paralelamente a esta tendência voltada para os valores compositivos classicizantes, desenvolveu-se uma tendência mais naturalista e lírica que procurava observar a realidade duma forma direta e não estruturada ou domesticada artificialmente, que teve no parisiense Nadar e no americano Mathew Brady os seus principais representantes. Em Portugal destacaram-se os trabalhos de Carlos Relvas e de Domingos Alvão.
No final do século, perante um cenário de rápidos avanços técnicos que levaram à industrializção e à produção em massa com a consequente democratização da fotografia, alguns artistas, que consideravam a fotografia como uma obra de arte, tentaram criar a imagem do génio iluminado cuja produção se distanciava das imagens mais banalizadas e popularizadas. Desenvolveu-se então um circuito de comércio e divulgação, sob a forma de exposições e de sociedade fotográficas, que sustentavam esta conceção da fotografia como arte. Estas sociedades, estabelecidas na década de 80 em Paris e Londres, rapidamente se propagaram a outras áreas geográficas.
Século XX (1.ª metade)
Um dos principais fotógrafos dos inícios do século XX, responsável tanto pela renovação da linguagem da fotografia e dos seus requisitos estéticos como pelo reconhecimento desta como forma autónoma de arte foi Alfred Stieglitz. Em 1902 este artista formou um grupo designado "Photo-Secession" e publicou entre 1903 e 1917 o jornal Camera Work, com objetivo de divulgar as obras deste conjunto de fotógrafos, de entre os quais se destacaram Alvin Coburn e Paul Strand.
A importância deste movimento artístico estendeu-se dos Estados Unidos à Europa, produzindo uma grande influência na obra de alguns fotógrafos ingleses e franceses. A temática fundamental desenvolvida por estes artistas ligava-se à representação da agitada vida social urbana dos tempos que antecederam a Primeira Guerra Mundial.
Após a guerra, tornou-se mais forte a influência de alguns movimentos artísticos de vanguarda, como o Cubismo, o Construtivismo, o Futurismo, sobre a evolução da fotografia. Gradualmente, a fotografia vai-se libertando das suas funções exclusivamente ilustrativas e figurativas, transformando-se num instrumento de pesquisas plásticas, num meio de produção de imagens que, muitas vezes, se tornavam abstratas.
A fotografia modernista teve como pioneiro o russo Alexander Rodchenko que, inspirado pela vida urbana e assumindo a câmara como um instrumento de revolução estética, realizou algumas composições vertigionas, baseadas em diagonais, bem representadas pelo trabalho "Clube Dínamo" de 1930. O seu colega construtivista, El Lissitsky desenvolveu também este meio expressivo, cruzando-o com pesquisas ao nível das artes gráficas, do cinema e da tipografia.
No âmbito da escola Bauhaus, László Moholy-Nagy, criou imagens provocativas, escolhendo pontos de vista inusitados, como o testemunha "Varandas da Bauhaus", realizada em 1925. Uma das contribuições mais originais deste artista foi, no entanto, a invenção da photo-collage e a criação de imagens totalmente abstratas através de "fotogramas" obtidos por impressão direta de objetos sobre o papel e para os quais dispensava o uso da máquina fotográfica.
Um dos mais prolíficos artistas do século XX foi Man Ray, instalado em Paris desde 1921. Influenciado inicialmente pelo Dadaísmo e posteriormente pelo Surrealismo, tornou-se a figura central das vanguardas fotográficas, abordando inúmeras linguagens e técnicas. Inventou os rayogramas e a solarização, imagens misteriosas, indefinidas e quase abstratas, obtidas de forma direta, sem uso da câmara, que se aproximavam dos fotogramas de Moholy-Nagy. Uma das suas obras mais conhecidas é a fotografia surrealista "Violon d'Ingres", realizada em 1924.
Paralelamente a estas pesquisas de carácter abstrato ou surrealista, alguns fotógrafos ligados à corrente da Nova Objetividade (Neue Sachlichkeit), como August Sander, abordaram temas ligados à vida urbana e ao quotidiano dos pós-guerra. Neste contexto destacaram-se também os fotógrafos Erich Salomon e André Kertész, este mais fortemente influenciado pelos trabalhos de Moholy-Nagy, como se observa na fotografia "O garfo", de 1928.
Próximos desta corrente figurativa que recusava a abstraçção, alguns artistas americanos continuaram a linha do movimento secessionista, desenvolvendo uma linguagem estética de sentido lírico, fortemente alicerçada na realidade. De entre estes salientou-se Edward Weston que, em 1932 funda o influente o grupo F/64.
O realismo fotográfico teve um dos seus apogeus com a corrente estética ligada aos fascismos e ao Realismo Socialista. O uso da fotografia como instrumento de propaganda política conheceu o seu apogeu com o trabalho de Leni Riefenstahl, uma das artistas oficiais do regime nazi.
Desde meados da segunda década do século, a fotografia assumiu cada vez mais o carácter de meio de comunicação de massas, tornando-se obrigatória, enquanto elemento de ilustração, em jornais e revistas.
Nos anos 30 surgiram revistas de grande divulgação especialmente vocacionadas para a produção de imagens, na qual trabalharam alguns dos principais fotógrafos da altura. De entre estas tiveram especial relevo a Vogue e a Life. O progresso do foto-jornalismo associado a esta revistas, que teve um importante impulso com a Segunda Guerra Mundial, culminou com a fundação, em 1947, da mítica agência "Magnum Photos" pelos fotógrafos Robert Capa e Henri Cartier-Bresson.
Paralelamente ao foto-jornalismo, a fotografia alia-se à moda e ao capitalismo, associando-se a revistas como a já referida Vogue ou a Vanity Fair. Caracterizados pelas imagens sedutoras e requintadas de personagens masculinos ou femininos ou de objetos de luxo, destacam-se nesta área os trabalhos de Helmut Newton, de Irving Penn ou Hoyningen-Huene (autor da conhecida foto "Fatos de Banho Izod", de 1930).
Século XX (2.ª metade)
Na segunda metade do século XX, acentuou-se a importância artística e o valor de mercado deste meio expressivo. O triunfo dos fotógrafos independentes, como Robert Frank ou Diane Arbus, sustentado pelos circuitos comerciais das galerias e legitimados pelas cíclicas exposições internacionais, levou à multiplicação dos géneros, dos temas e das linguagens.
Aproximando-se de correntes conceptualistas, Bernd e Hilla Becher desenvolvem séries de fotografias neutras e frias de edifícios industriais. A obra de Jeff Wall e de Thomas Ruff apresenta tendências para um realismo ainda mais intenso e artificial que a própria realidade que alinha pelas tendências hiper-Realistas.
A Arte Pop encontra-se representada em alguns dos retratos de celebridades realizados por Andy Warhol, aos quais associa geralmente a serigrafia. Gilbert e George, cruzando influências da Arte Pop e da Arte Conceptual, fazem montagens de grande dimensão sobre vidro.
A instalação é o meio preferido por Boltanski, enquanto Cindy Sherman desenvolve uma obra autobiográfica na qual questiona o papel da mulher na sociedade contemporânea, abordando um dos temas recorrentes de finais do século, das sexualidade e seus tabus, questões igualmente presentes nos trabalhos classicistas do americano Robert Mapplethorpe.
A 19 de agosto, comemora-se o Dia Mundial da Fotografia.
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