Quarenta árvores em discurso directo

António Bagão Félix

As histórias que nos matam

Maria Isaac

O segredo de Tomar

Rui Miguel Pinto

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Irão e a Ásia Central entre dois Mundos: 130 a. C. a 751 d. C.
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Na segunda metade do século II a. C., pela primeira vez, o poder dos Partos entrou em contacto direto com o Império Chinês e recebeu uma embaixada do imperador Han, Wu-ti (140-97 a. C.), que enviou uma escolta de 20 mil homens ao seu encontro. Os chineses estavam particularmente interessados nos cavalos criados em Fergana, que necessitavam para criar uma infantaria capaz de combater os nómadas Hsiung-nu na sua fronteira setentrional.
No auge do seu poder, Mitridates II, Filileno, rei da Arsácia (dinastia parta), assumiu o título de "rei dos reis". A Este, tal como no Oeste, o seu império atingiu uma posição de poder e estabilidade anteriormente desconhecidas. Manteve relações diplomáticas com dois dos maiores poderios do Mundo, Roma e China. Mitridates I, Frates II e Mitridates II foram os verdadeiros criadores do Estado Parto (de influência Selêucida), obtendo vitórias militares e económicas, elevando-o a um nível comparável ao do antigo Império Persa dos Aqueménidas. Após a morte de Mitridates II e de um curto período de intrigas e rivalidades, sucederam, por curtos períodos de tempo, Gotarzes, Orodes I e Sanatruces. Este último chegou ao trono em idade avançada e foi substituído pelo seu filho, Frates III (70-58/57 a. C.), que manteve contactos com Roma.
A posição tomada pelos Romanos em relação aos Partos foi mais a de conquistador do que aliado. A política de Pompeu tornou-se clara: do Cáucaso ao golfo Pérsico, esperava criar um conjunto de estados amistosos de Roma que cercariam o reino Parto, como preparação para a conquista romana.
Três anos mais tarde, a tensão entre as duas potências foi sangrenta e a rutura foi consumada em 53 a. C. Sem provocação, a armada de Crasso atravessou o Eufrates. Orodes II protestou e invocou o tratado de amizade em vão. Crasso recusou responder até à sua chegada a Selêucida no Tigre. Foi a rutura brutal de todos os acordos concluídos em 69 e 66 a. C.
A batalha próxima de Carre (53 a. C.), comandada por Surenas, com a sua infantaria pesada, custou a Roma sete legiões e as vidas de Crassus e seu filho. Como consequência da vitória de Surenas, as rotas do Irão e da Índia foram vedadas a Roma, e as suas ambições no Oriente foram tão enfraquecidas que o Eufrates tornou-se não apenas uma fronteira política mas também uma fronteira espiritual. Os esforços de latinização deixaram de ser possíveis.
Sob Orodes II, os Partos atingiram o auge do seu poder: de facto, no Oeste, os Arsácidas restabeleceram a quase totalidade do Império Aqueménida por um curto período de tempo. O seu sucesso no Este parece ter sido igualmente importante. A sua capital foi deslocada para Ctesifonte, onde o campo militar foi transformado numa grande metrópole. Em Nisa a cidade expandiu-se, os palácios reais eram maiores, os hipogeus reais foram enriquecidos com belas peças de arte greco-iraniana.
O novo estádio no período filo-helenístico iniciou-se por volta de 31 a. C., quando, após a sua vitória, Octávio (agora Augusto) era o único senhor de Roma. Antes disso, porém, ele já tinha proposto uma aliança e um tratado para pôr fim à guerra. A batalha de Carre e a derrota de António pôs a Pártia aos olhos de Roma como um perigo constante. Uma "amizade" renovada permitiria o regresso dos prisioneiros romanos. Por fim, foi assinado um pacto em 20 a. C. que permitiu o regresso dos prisioneiros romanos e as insígnias das legiões conquistadas. Uma nova etapa começou nas relações entre os dois estados, marcada pela conclusão de uma paz real que reconheceu o Eufrates como fronteira entre ambos. Roma renunciou as suas ambições no Este, e Augusto inaugurou a política de respeito. A caravana da rota para a Índia e China estava aberta. Augusto recebeu embaixadores de muitos povos orientais. O único país no Oriente onde Roma permanecia ativa era a Arménia.
Por volta do século 10 ou 9 a. C., Frates enviou os seus filhos e netos a Roma, num gesto de confiança na "amizade" com os romanos, mas também de garantia de que o seu trono passaria para um seu filho de Musa, uma escrava italiana que lhe tinha sido oferecida por Augusto. Frates V, que ficara na Pártia, viria a assassinar o seu pai com a ajuda da sua mãe, e ocuparia o trono de 2 a. C. a 4 d. C., depois de ter casado com a sua mãe.
O fim deste período "filo-helenístico" é marcado pelo conflito entre a classe governante e as influências estrangeiras que tinham penetrado a vida da sociedade parta. Estas influências vinham de Roma e eram introduzidas frequentemente pelos príncipes da casa Arsácida que regressavam do exterior.
O novo e importante período na história parta, frequentemente denominado "anti-helenístico", abarca um século e meio e vai de 12 a 162 d. C. É caracterizado pela expansão nacional da cultura parta e uma oposição a tudo o que viesse do exterior. A fraqueza da dinastia reinante abriu caminho à nobreza para se envolver na existência oficial do estado. A nobreza escolhe o soberano cujo reinado inicia a primeira fase neste novo período.
O rei escolhido pelos barões para substituir Vonones foi Artabanus III (12-38). Contudo, estavam certamente errados ao acreditarem que encontrariam neste monarca um instrumento fácil para manipular. Artabano era o filho do vice-rei da Hircânia e só era arsácida pelo lado materno. Sob o seu governo, Pártia entrou numa era brilhante mas problemática, completamente dominada pela personalidade deste soberano, violentamente anti-Roma, e cujo desejo maior era expulsar Roma da Ásia. Após uma tentativa falhada para colocar o seu filho no trono da Arménia, Artabano evitou confrontos com Roma e dedicou-se a reformas internas, entre as quais a centralização.
A forte personalidade de Artabanus III não procurava impor o seu reino como uma potência mundial, mas não hesitou em fazer planos para recuperar a província oriental, as possessões formalmente aqueménidas.
O período de 51 a 122 mostra a lenta dissolução do Estado parto e a sua decomposição em pequenos países como um resultado inevitável da debilidade do poder central. No século 1 d. C., o Império Parto, de acordo com o historiador romano Plínio, era composto por 18 reinos, onze no Norte e sete no Sul, alguns governados pelos príncipes arsácidas e outros por dinastias locais. Em 58 Hircânia tornou-se independente. No domínio dos assuntos externos, foi feito um esforço para manter boas relações com Roma, especialmente por causa do novo reino de Kushan, motivo de preocupação nas fronteiras orientais. Pode ter sido por esta razão que em 87, Pártia enviou uma embaixada a este novo reino.
Em 78 Pacorus II chegou ao trono, mas foi substituído em 79 pelo também efémero reinado de Artabano IV (80/81), destronado prematuramente por Pacoro III. Durante o seu reinado, o país mostrou sinais de profunda decomposição. Em 109/110 Pacoro II foi substituído por Osroes.
Em 114 o imperador Trajano invadiu a Arménia. O rei pôs a seus pés a sua coroa, mas é em vão pois foi derrotado pelo exército romano. Com a Arménia ocupada, o Imperador desceu com o seu exército para a Mesopotâmia. Toda a Babilónia foi tomada e Ctesifonte, a capital, caiu nas mãos dos romanos, que levaram a filha de Osroes e o trono dourado dos reis pártios. Vitorioso, Trajano aventurou-se até ao golfo Pérsico, mas a reação iraniana não tardou em chegar. Confrontados com a gravidade da ofensiva romana, todos os príncipes da casal real, divididos por contendas internas, uniram-se contra o invasor. Em Ctesifonte, Trajano coroou um novo rei vassalo, mas a revolta estava no ar e as tentativas para desunir os chefes pártios eram infrutíferas. Os romanos acabaram por sofrer bastantes perdas, e, após um recuo nas muralhas de Hatra, Trajano acabou por abandonar a campanha. Morre no regresso a casa. O sucessor de Trajano, Adriano (117-138), abandonou todas as pretensões relativamente à Arménia, Mesopotâmia e Assíria. O desejo de paz de Adriano parece ter sido sincero.
Foi um período de 40 anos de paz com Roma. O status quo que manteve com o seu vizinho ocidental parece ter sido uma necessidade para o reino pártia, a expansão do reino de Kushan nas fronteiras orientais atingiu o seu ponto alto com o rei Kaniska. Não existe informação exata sobre as relações entre partas e kushans, mas esta longa paz mantida com Roma leva a acreditar que certas precauções eram necessárias para o reino do Irão.
Os 40 anos de paz foram sucedidos por hostilidades quase ininterruptas com Roma, ficando o Irão mais vulnerável dada a situação exposta da sua capital.
As tensões entre os dois estados não diminuíram quando Vologases IV (191-208/209) apoiou um pretendente contra o imperador Sétimo Severo.
Nos inícios do século III d. C., o Império Arsácida contava já uma existência de 400 anos. A sua força tinha sido enfraquecida pelas invasões romanas sucessivas e o império mais uma vez divididiu-se.
Alguns anos mais tarde, pouco antes da sua morte, provavelmente por questões de saúde, Ardashir abdicou do trono em favor do filho Shapur I. Este assumiu as responsabilidades do governo, mas adiou a sua coroação até à morte de seu pai. Pouco depois da sua coroação, Shapur confrontou-se com uma invasão da Pérsia comandada pelo imperador Gordiano II (238-244). Uns anos mais tarde, em 256 d. C., deu-se mais um confronto entre persas e romanos.
Em contraste com o seu pai, que reclamava ser "rei dos reis do Irão", Shapur I assumiu o título de "rei dos reis não iranianos". Esta fórmula foi mantida pelos seus sucessores como uma designação habitual dos imperadores sassânidas. As dinastias locais hereditárias, que sob o domínio dos Arsácidas governaram a maior parte das províncias importantes, foram largamente abolidas.
Outra tendência que se desenvolveu no período sassânida, que já se havia manifestado com os Arsácidas, foi o princípio estrito da legitimidade dinástica. Era extremamente raro um usurpador sem sangue real aceder ao trono, o que no entanto foi conseguido por Bahram VI Chubin.
Em termos religiosos, assiste-se a um importante desenvolvimento do zoroastrismo durante o período sassânida. De facto, a evolução do zoroastrismo como religião organizada teve o seu início por esta altura.
Apesar das origens eclesiásticas da sua família, Ardashir parece não ter sido a pessoa responsável pelo início estas novas direções das questões religiosas. Em tempos foi aceite que a institucionalização da Igreja zoroastra e a codificação das suas escrituras foram obra de um sacerdote chamado Tansar, um contemporâneo de Ardashir.
Durante o reinado de Shapur I um novo líder e movimento religioso fazem o seu aparecimento. Mani era originário de uma família pártia que vivia na Babilónia. Os ensinamentos de Mani assentavam numa forte influência das ideias e filosofias agnósticas. Mani auto proclamava-se o último apóstolo de Jesus tal como o paracleto anunciado no Evangelho de S. João. Com a interpretação agnóstica do Evangelho, Mani tentou combinar as doutrinas de Zoroastro e Jesus de forma a criar uma nova religião de carácter universal. Durante o reinado de Shapur a religião propagou-se não só dentro como fora do Irão. O herdeiro do trono, Hormizidas I, foi também favorável a esta nova religião. O filho mais novo de Shapur, Bahram I, porém, pressionado pelo poder eclesiástico, mandou executar Mani e o maniqueísmo seria perseguido e destruído no Irão.
A invasão árabe do Irão fez uma rutura com o passado, afetando não só o Irão mas toda a Ásia Ocidental, resultando na assimilação de povos que formaram e vitalizaram a cultura muçulmana. O profeta Maomé fez de Medina, a sua cidade de adoção, e Meca, o seu local de nascimento, centros de um movimento árabe que os muçulmanos árabes tornaram num movimento mundial pela conquista dos territórios árabes e bizantinos. Nunca os impérios iranianos e bizantinos tinham sido familiarizados com esses árabes, que eram vassalos dos impérios de fronteira Lakhmid e Gassânida. Também os árabes de Meca e Medina tinham mantido contactos comerciais com os bizantinos e os sassânidas. A imunidade do antigo santuário de Meca contra os foras da lei e a violência deram a esta cidade a uma grande importância comercial.
Pouco tempo antes da assimilação árabe com os iranianos, nas regiões colonizadas, tem origem um novo movimento islâmico, o movimento muçulmano Abu, em 747.
A revolução que estabeleceu os Abássidas (750-821) representou um triunfo dos elementos islâmicos Hejazi no império.
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Como referenciar
Porto Editora – Irão e a Ásia Central entre dois Mundos: 130 a. C. a 751 d. C. na Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora. [consult. 2025-05-20 08:32:50]. Disponível em
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