2 min
Novos Contos da Montanha
Publicada em 1944, Novos Contos da Montanha é uma coletânea de 22 contos, da autoria do consagrado escritor Miguel Torga.
Contos germinados e medrados na Montanha, de acordo com palavras do próprio autor, dirigidas ao leitor, no prefácio à segunda edição "Escrevo-te da Montanha, do sítio onde medraram as raízes deste livro", estes textos narrativos, numa linha de continuidade da obra Contos da Montanha, percecionam histórias acontecidas num espaço e vividas por gentes que enformam a memória da infância e da adolescência de Miguel Torga. Este espaço, definido pelo autor, como o "Reino Maravilhoso", povoado por uma existência materialmente pobre, mas eticamente rica, foi, simultaneamente, o seu berço e a sua escola, comprometendo-se este, em nome da "consciência coletiva" do leitor, enquanto entidade responsável socialmente, a denunciar aquele quotidiano de fome, ignorância e desespero.
Testemunho da vivência sofrida dos seus "irmãos" transmontanos, estes contos ilustram personagens, de tipo torguiano que reconhecemos como "autênticas" e inteiras e que fazendo parte do Portugal de hoje, constituem uma "montra de heróis montanheses, revoltadamente livres e trágicos na sua solidão". Verdadeiras, estas são personagens detentoras de vícios e de virtudes, atuando de acordo com a circunstancialidade cultural que se vem projetando ao longo dos tempos.
Assim, o conto O Alma Grande apresenta-nos uma personagem que nos remete para a morte e para a forma como esta gente serrana convive com ela. Na verdade, vestindo a pele de Parca, o Alma Grande aparece a pedido dos familiares dos doentes em fase terminal para lhes cortar o cordão umbilical que os liga precariamente à vida, como forma de lhes aliviar o sofrimento. Entendido assim pelos adultos, esta personagem vai ter que se debater com o esturtor de Isaac que, agarrado à vida, consegue escapar às tenazes e ao peso do joelho da "morte". Incapaz de agir perante o filho do moribundo, Abel, que entrara no quarto, levado pela curiosidade e vontade de compreender aquela presença, o Alma Grande não conseguiu concluir o seu trabalho.
O conto O Leproso apresentam-nos um conjunto de personagens de tipo kafkiano, contextualizadas num tempo e num espaço que é, metaforicamente, o das trevas. Narrando uma ação situada em Loivos, no Douro, este conto centra-se no quotidiano de um conjunto de trabalhadores, "camaradas de suor" que " eram (?) amigos, daquela amizade possível entre gente rude e sacrificada, sem licença para aventuras intensas do coração e do entendimento.". Assolados pelo medo provocado pela desconfiança de que Julião, camarada de trabalho, contraíra a lepra, votaram-no ao ostracismo. Sentindo-se completamente abandonado pelos amigos, num momento em que mais precisava deles, e após várias tentativas para combater a doença, Julião prepara a vingança. Vendendo o azeite onde se banhou (para se curar) ao fornecedor da aldeia, espalha o pânico na população. Esta atitude desesperada desencadeia uma resposta que, crescendo como uma bola de neve, se torna impossível de controlar, levando à trágica morte pelo fogo de Julião.
Como estas, todas as personagens dos contos desta coletânea se constituem numa tradição cultural telúrica e se movimentam no espaço íntimo da memória do autor. Assumindo-se como um escritor cujos textos brotam da terra que lhe deu vida, a sua escrita não é, contudo, localmente circunscrita. Pelo contrário, a sua mensagem e os valores veiculados pelas suas personagens têm uma dimensão muito mais abrangente, capaz de transformar uma realidade localizada numa realidade universal.
Novos Contos da Montanha é uma compilação constituída por 22 contos que têm os seguintes títulos: O Alma Grande, Fronteira, O Pastor Gabriel, Repouso, O Caçador, O Leproso, Destinos, O Lopo, O Sésamo, Mariana, Natal, Névoa, Renovo, O Regresso, A Confissão, O Milagre, O Artilheiro, Teia de Aranha, A Festa, O Marcos, A Caçada e O Senhor.
Contos germinados e medrados na Montanha, de acordo com palavras do próprio autor, dirigidas ao leitor, no prefácio à segunda edição "Escrevo-te da Montanha, do sítio onde medraram as raízes deste livro", estes textos narrativos, numa linha de continuidade da obra Contos da Montanha, percecionam histórias acontecidas num espaço e vividas por gentes que enformam a memória da infância e da adolescência de Miguel Torga. Este espaço, definido pelo autor, como o "Reino Maravilhoso", povoado por uma existência materialmente pobre, mas eticamente rica, foi, simultaneamente, o seu berço e a sua escola, comprometendo-se este, em nome da "consciência coletiva" do leitor, enquanto entidade responsável socialmente, a denunciar aquele quotidiano de fome, ignorância e desespero.
Testemunho da vivência sofrida dos seus "irmãos" transmontanos, estes contos ilustram personagens, de tipo torguiano que reconhecemos como "autênticas" e inteiras e que fazendo parte do Portugal de hoje, constituem uma "montra de heróis montanheses, revoltadamente livres e trágicos na sua solidão". Verdadeiras, estas são personagens detentoras de vícios e de virtudes, atuando de acordo com a circunstancialidade cultural que se vem projetando ao longo dos tempos.
Assim, o conto O Alma Grande apresenta-nos uma personagem que nos remete para a morte e para a forma como esta gente serrana convive com ela. Na verdade, vestindo a pele de Parca, o Alma Grande aparece a pedido dos familiares dos doentes em fase terminal para lhes cortar o cordão umbilical que os liga precariamente à vida, como forma de lhes aliviar o sofrimento. Entendido assim pelos adultos, esta personagem vai ter que se debater com o esturtor de Isaac que, agarrado à vida, consegue escapar às tenazes e ao peso do joelho da "morte". Incapaz de agir perante o filho do moribundo, Abel, que entrara no quarto, levado pela curiosidade e vontade de compreender aquela presença, o Alma Grande não conseguiu concluir o seu trabalho.
O conto O Leproso apresentam-nos um conjunto de personagens de tipo kafkiano, contextualizadas num tempo e num espaço que é, metaforicamente, o das trevas. Narrando uma ação situada em Loivos, no Douro, este conto centra-se no quotidiano de um conjunto de trabalhadores, "camaradas de suor" que " eram (?) amigos, daquela amizade possível entre gente rude e sacrificada, sem licença para aventuras intensas do coração e do entendimento.". Assolados pelo medo provocado pela desconfiança de que Julião, camarada de trabalho, contraíra a lepra, votaram-no ao ostracismo. Sentindo-se completamente abandonado pelos amigos, num momento em que mais precisava deles, e após várias tentativas para combater a doença, Julião prepara a vingança. Vendendo o azeite onde se banhou (para se curar) ao fornecedor da aldeia, espalha o pânico na população. Esta atitude desesperada desencadeia uma resposta que, crescendo como uma bola de neve, se torna impossível de controlar, levando à trágica morte pelo fogo de Julião.
Como estas, todas as personagens dos contos desta coletânea se constituem numa tradição cultural telúrica e se movimentam no espaço íntimo da memória do autor. Assumindo-se como um escritor cujos textos brotam da terra que lhe deu vida, a sua escrita não é, contudo, localmente circunscrita. Pelo contrário, a sua mensagem e os valores veiculados pelas suas personagens têm uma dimensão muito mais abrangente, capaz de transformar uma realidade localizada numa realidade universal.
Novos Contos da Montanha é uma compilação constituída por 22 contos que têm os seguintes títulos: O Alma Grande, Fronteira, O Pastor Gabriel, Repouso, O Caçador, O Leproso, Destinos, O Lopo, O Sésamo, Mariana, Natal, Névoa, Renovo, O Regresso, A Confissão, O Milagre, O Artilheiro, Teia de Aranha, A Festa, O Marcos, A Caçada e O Senhor.
Partilhar
Como referenciar
Porto Editora – Novos Contos da Montanha na Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora. [consult. 2024-12-09 10:25:02]. Disponível em
Outros artigos
-
NatalO sentido social maior da festa do Natal é, sem dúvida, a reunião da família. Num mundo em que as pe...
-
MarianaPersonagem da novela Amor de Perdição, filha de João da Cruz, é "uma formosa rapariga da aldeia", de...
-
O CaçadorPoderoso drama de guerra, foi realizado por Michael Cimino em 1978 com o título The Deer Hunter e te...
-
FronteiraAspetos Geográficos O concelho de Fronteira, do distrito de Portalegre, localiza-se no Alentejo (NUT...
-
AbelÉ um dos símbolos bíblicos da inocência. De acordo com o Antigo Testamento, Abel foi o segundo filho...
-
IsaacDe acordo com o Génesis, era filho de Abraão e de Sara e nasceu na sequência de uma promessa divina,...
-
cordão umbilicalÉ um órgão cordiforme, que apresenta na periferia um tecido epitelial, tendo no seu interior uma mas...
-
PortugalGeografia País do Sudoeste da Europa. Situado na parte ocidental da Península Ibérica, abrange uma s...
-
consciência coletivaO conceito de consciência coletiva, embora não de modo exclusivo - refira-se que o marxismo assume c...
-
Miguel TorgaPseudónimo de Adolfo Correia da Rocha e autor de uma produção literária vasta e variada, nasceu em S...
ver+
Partilhar
Como referenciar
Porto Editora – Novos Contos da Montanha na Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora. [consult. 2024-12-09 10:25:02]. Disponível em