Silabário
Inclui, além dos três títulos já editados, Sequência de Bilbau, In Memoriam e O Enterro do Senhor Orgaz, inéditos e composições publicadas dispersamente em jornais e revistas, reunidos em Temas com Variações (1979-1992) e Fragmentos (1952-1990). Em "Notas", aponta escrupulosamente a proveniência e datação dos textos, e especifica todos as alusões textuais efetuadas nas composições, o que se revela um instrumento importante de análise numa poesia que beneficiou, pelo diálogo com os cancioneiros místicos e profanos do classicismo ibérico, do apuramento de uma técnica de glosa de reminiscências poéticas e bíblicas. Amadurecidos ao longo de quarenta anos de atividade poética, os textos de Silabário atestam uma preferência pelo verso livre, amplo e ritmado, por uma discursividade organizada sintaticamente e decalcada do versículo. Marcada tematicamente pela disrupção do equilíbrio entre o homem e o universo, por uma perceção disfórica da realidade, herdada talvez do diálogo com a poesia do Século de Ouro, e que se exercita a denunciar a ilusão de todas as coisas, a esterilidade de todos os esforços humanos, a expressão poética de uma primeira fase inclui o autor numa geração agónica que, entre 50 e 60, viveu uma experiência de emparedamento histórico que duplicou a angústia existencial do período pós-guerra. Pessimismo que ecoa ainda no seu livro de estreia, Sequência de Bilbau, poema da cidade e das memórias, que parte do espaço físico onde se situaram a vivência dos lugares, os rostos, as despedidas, para o espaço metafísico do ser que se questiona se "Haverá para nós outro lugar, além daquele onde nascemos? [...] Ocupamos cidades agressivas, arrastando / de umas para outras uma estéril bagagem / de agasalhos, insónias e um livro / que é sempre o mesmo, com distintos nomes". A expressão de uma emoção profunda e simultaneamente contida, a solenidade hierática que a dicção versicular transmite são então elemento de apaziguamento para um sujeito poético que, esgotado em "tarefas manchadas", alienado "em troca de uma ração sofrível" (Temas e variações, composição 40), lançado num "mundo convulso", recebe, pela poesia, o dom da harmonia: "Neste momento ignoro o que hei de chamar belo. / A submissão a um cânone? A emanação do arcano? / A boca ou o verbo que tornamos nosso hálito? / - Tudo isso exumarão de nosso corpo ausente. / Porém, há de suster-me o vislumbre desperto / deste espaço tão diáfano que nele transparecem / quantos o edificaram e por ele relevam / a harmonia que sempre nos concilia e excede." (p. 73)
Partilhar
Como referenciar
Porto Editora – Silabário na Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora. [consult. 2025-04-29 03:14:25]. Disponível em
Outros artigos
-
verso livreNa poética clássica, o verso livre integrava um sistema de versos heterométricos. A partir do Simbol...
-
SenemutArquiteto principal da rainha Hatchepsut (1473-1458 a. C.), as suas datas extremas de vida são desco
-
SaloméProtagonista de O Milagre Segundo Salomé, romance estruturado a partir da coincidência entre uma sup
-
SanciriloPrémio literário do Círculo de Leitores, a obra com que António Manuel Pires Cabral se estreia na fi
-
Sérgio SantanaEscritor brasileiro, nascido em 1941, é autor de varias obras, destacando-se sobretudo pelas suas pr
-
Roteiro SentimentalMisto de diário, impressões de viagem e romance histórico, o Roteiro Sentimental descreve as reflexõ
-
sarcófagoO termo sarcófago, em si, alude a uma grande caixa ou ataúde de forma retangular. A generalização do
-
RopicapnefmaA Ropicapnefma, título de sabor grego com o significado de "mercadoria espiritual", é um colóquio ou
-
RomanceiroCompilação das lendas e romances portugueses de tradição oral ou escrita, produto do trabalho de rec
-
Rumores VulcânicosObra dedicada a Teófilo Braga, destinada, segundo o autor, a "dar mais uma machadada no tronco secul
Partilhar
Como referenciar 
Porto Editora – Silabário na Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora. [consult. 2025-04-29 03:14:25]. Disponível em