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As Grandes Conquistas do Homem: do Fogo aos Utensílios
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Ao que tudo indica, a África Oriental terá sofrido uma importante alteração do clima há cerca de um milhão e meio de anos. Os lagos tornaram-se mais pequenos, os rios secaram e as florestas e matas foram substituídas por territórios abertos, cobertos por herbáceas. Esta alteração terá contribuído para a evolução de algumas espécies e para a extinção de outras - facto aceite com base nos registos fósseis. Naturalmente, esta alteração também afetou os nossos antepassados. Foram encontrados vestígios de um antepassado com o cérebro mais desenvolvido e que usava uma utensilagem mais sofisticada do que a do Homo habilis.
A capacidade para fazer utensílios é um dos traços fundamentais que distinguem a espécie humana das outras espécies; de facto, o aparecimento de utensílios de pedra, há 2,5 milhões de anos, marcou o primeiro passo no desenvolvimento cultural humano. O fabrico de utensílios terá permitido alargar a variedade de comida disponível, assim como adaptar materiais como a madeira, cascas de árvore, couro e canas para as tarefas quotidianas.
Os mais antigos utensílios de pedra remontam há 2,5 milhões de anos e foram encontrados em Hadar, na Etiópia. Instrumentos semelhantes foram descobertos num contexto mais recente na África Oriental, em Olduvai Gorge (como tal, são conhecidos como olduvaienses), e consistem em seixos com gumes irregulares, fabricados com a ajuda de um percutor que retirava lascas do seixo até obter a forma pretendida. Foi empregue uma grande variedade de matérias-primas (basalto, lava, quartzo, quartzite) e as lascas resultantes do talhe eram também aproveitadas como instrumentos para o esquartejamento de animais.
A produção de utensílios é característica da nossa espécie
A carne era, evidentemente, uma componente importante na dieta dos primeiros humanos, mas é possível que esta não fosse obtida através da caça; provavelmente, os hominídeos limitavam-se a aproveitar a carne dos animais encontrados mortos ou a capturar um animal doente ou incauto. No entanto, diversos jazigos posteriores sugerem que o Homo erectus era um verdadeiro caçador e estava já bem preparado para caçadas conjuntas.
Os primeiros humanos eram provavelmente bastante sociáveis e viviam em grupos permanentes. A partilha da comida e o início da divisão de tarefas entre machos (concentrados no aprovisionamento de carne) e fêmeas (concentradas no aprovisionamento de alimentos de origem vegetal) terá ocorrido de forma gradual, à medida que a caça se tornava cada vez mais importante. A descoberta de abrigos nas proximidades de Olduvai Gorge parece indicar que os acampamentos-base - locais ocupados por períodos de tempo substanciais e para onde era trazida a comida - estavam já desenvolvidos há 1,8 milhões de anos.
A alteração mais significativa operada na tecnologia dos artefactos de pedra foi o desenvolvimento da indústria acheulense, caracterizada por cutelos e bifaces. Esta não foi a única indústria a surgir neste período e a grande diversidade nos tipos de utensilagem de pedra foi um dos traços fundamentais nesta época. Na zona de Koobi Fora, Quénia, existia a indústria karari, que se caracterizava por grandes raspadeiras, enquanto em Olduvai, o olduvaiense dá lugar a uma nova indústria conhecida por olduvaiense evoluído.
As indústrias acheulenses continuaram por mais um milhão de anos, dispersando-se da África para a Europa e a Ásia. Os machados foram provavelmente mais eficientes para o corte de carne do que as lascas e podem também ter sido utilizados para outras tarefas. Alguns factos fazem-nos crer que, em África, durante o período acheulense, eram já abatidos animais de grande porte e, em alguns casos, a descoberta de restos de um grande número de animais num mesmo local sugere que tenham sido abatidos numa só caçada. Esta evidência indica também que a caça "ativa" estaria, gradualmente, a desenvolver-se como principal fonte de obtenção de carne, em detrimento da "necrofagia". Relativamente às plantas, parece ser evidente que estas, mais do que a carne, estiveram sempre presentes na dieta de subsistência em África. Dos poucos vestígios encontrados que suportam esta afirmação, são de destacar as sementes de algumas plantas encontradas em Kalambo Falls. Este local é importante por também aqui terem sido encontrados vestígios do uso de madeira (utilizada para o fabrico de instrumentos ligados ao quotidiano).
Não se sabe, ao certo, quando é que o fogo começou a ser utilizado em África e os seus vestígios podem ter-se perdido em muitos sítios.
A descoberta do fogo constituiu um substancial avanço: passou a ser possível cozinhar alimentos, iluminar as cavernas, endurecer as pontas das lanças de madeira e manter os animais afastados.
Em finais do Acheulense, aproximadamente 120 000 anos atrás, muitos dos aspetos do comportamento humano já estavam em marcha, entre os quais a combinação da caça e da recoleção como forma de vida bem sucedida, o fogo e a simples, mas efetiva, tecnologia em madeira e pedra.
A partir da altura em que se tornaram verdadeiramente hábeis na caça, os nossos antepassados estavam já em condições de se arriscar em deslocações para regiões e climas desconhecidos. Terá sido nesta altura (há um milhão de anos) que o Homo erectus se começou a dirigir para o Norte e a sair de África, atravessando o continente.
Os jazigos de despojos de animais com cerca de um milhão de anos nas montanhas da Etiópia demonstram que já caçavam animais de grande porte, como, por exemplo, hipopótamos. Nesta fase, é evidente que o Homo erectus já sabia como se deveria alimentar nos diferentes meios.
Também na Síria e em Israel foram detetados alguns jazigos. Para além dos restos de comida habituais e utensílios de pedra, no jazigo sírio podem ver-se amontoados de pedregulhos, que sugerem a base de um abrigo. Aqui, a variedade de animais caçados é surpreendente: elefantes, rinocerontes, cavalos e mesmo camelos.
Não muito depois, há cerca de 700 000 anos, aparecem fósseis de Homo erectus em vários jazigos na Europa.
As escavações em Torralta e Ambrona (Espanha) sugerem que o Homo erectus fazia surtidas regulares a este vale espanhol para caçar grandes quantidades de elefantes, cavalos, veados, gamos e bois selvagens. Em alguns locais constata-se que os animais foram armadilhados, desmanchados e seguidamente transportados para o acampamento.
O contraste entre os acampamentos simples do Homo habilis e as caçadas organizadas, as cabanas, o fogo e os lares do Homo erectus é realmente impressionante. Os machados usados por estes eram muitas vezes obras de arte e os utensílios eram sempre feitos segundo o mesmo modelo. Existem também vestígios da utilização de pigmentos de cor, como o ocre vermelho, o que nos sugere que o Homo erectus já não se limitava a caçar ou a lutar pela sobrevivência: talvez as cores apelassem para a imaginação dos caçadores e as aplicassem nos corpos ou nas pedras.
A caça, a utensilagem, as cabanas e a possível aplicação de ocre indicam que a sociedade humana se tornara mais complexa já cerca de um milhão de anos antes (a partir de há c. 1 500 000 anos). O Homo erectus não é já somente um caçador-recoletor tropical, mas uma espécie bem sucedida que aprendera a lidar com o clima frio e a alternância de estações nas latitudes boreais.
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Como referenciar
Porto Editora – As Grandes Conquistas do Homem: do Fogo aos Utensílios na Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora. [consult. 2024-10-05 22:13:18]. Disponível em

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