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Movimentos Pauperistas
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Desde há muito que se pregava, na cristandade medieval, um retorno à pobreza evangélica dos primeiros tempos. As reformas das ordens monásticas, entre os séculos X e XI, já prenunciavam esse ideal de retorno à vida pobre e penitencial. Nestes tempos medievais, esta vida apostólica estava intimamente ligada a um ideal de pregação errante, à imagem de Cristo e dos seus Apóstolos.
As cruzadas aumentaram ainda mais a nostalgia desses tempos de vida em pregação, de lugar para lugar, pobremente, ou então de solidão eremítica, ao sabor da Natureza. Este saudosismo rapidamente desencadeou uma onda de adesão popular em todo o Ocidente, tal era a influência do clero e, nomeadamente, da vida monacal no imaginário e quotidiano cristãos. Não só os retornados da Terra Santa, mas os que por lá ficavam - como os eremitas do monte Carmelo ou do Sinai - sentiam-se tocados pelo exemplo vivo da pobreza de Cristo e do Evangelho. Todos queriam imitá-Lo, acorrendo multidões de peregrinos a escutar as pregações desses homens carismáticos, que rapidamente passam para a Europa e congregam facilmente grupos - depois movimentos - de seguidores. A Igreja institucional e hierarquizada de Roma e dos bispos desde cedo desconfiou destas correntes pauperistas e deles se distanciou, pois comungava da riqueza feudal vigente na Europa senhorial. O clero estava profundamente conotado com os senhores de então.
Por outro lado, este desejo de retorno à pobreza e à vida simples marca a emancipação do leigo e da sua autonomia espiritual no mundo da crença e da fé. Por isso, o povo recorre à Bíblia, caindo muitos em pensamentos heréticos ou atitudes antieclesiásticas. Alguns recusam a Eucaristia, outros a posse de bens pelo clero, outros defendem uma penitência radical, como o reformador religioso italiano Arnaldo de Bréscia (c. 1100 - c. 1155), que atacou ferozmente o papado e as riquezas temporais da Igreja.
Muitos serão os grupos e tendências heréticas que surgem nos séculos XI e XII, como os Valdenses (ou Pobres de Lião), de Pedro Valdo (século XII) ou os Cátaros (ou Albigenses), principalmente no Sul de França e Norte de Itália. Valdo e o seu movimento penderam totalmente para uma via marginal, sendo condenados em bloco. Os Cátaros atingem, todavia, uma dimensão maior, arrastando multidões e toda uma região inteira atrás de si (Languedoc). Motivaram ofensivas pastorais da Igreja, bem como duas repressões militares, insuficientes para os eliminar totalmente. O seu ideal maniqueísta (dualidade Bem/Mal), inspirado nos Bogomilos (seita oriunda da Macedónia e Bulgária), baseava-se na pureza, sustentada pela ascese, pobreza e perfeição. Do ponto de vista social e comunitário, este movimento pauperista era tenebroso, com promiscuidade sexual e ausência de códigos de conduta morais e cívicos.
A Inquisição surgirá, de certa forma, para combater estas tendências heréticas destes ímpetos em grupo de retorno à pobreza. Outros movimentos do género apareceram também na Europa, como os Humilhados (Norte de Itália) e as Beguinas (Países Baixos), embora estes exemplos tenham gozado de maior simpatia pela hierarquia da Igreja. As Ordens Mendicantes (como os Franciscanos, Dominicanos, Carmelitas, entre outros) manterão e reforçarão essa aspiração pauperística, mas integrada na Igreja e submetendo-se ao Papa e à hierarquia eclesiástica, servindo-a e lutando até contra as heresias de carácter pauperístico. As pestes e fomes do século XIV e a Inquisição conseguiram, porém, eliminá-las.
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Como referenciar
Porto Editora – Movimentos Pauperistas na Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora. [consult. 2025-05-23 03:09:29]. Disponível em

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