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Comércio de Escravos
As necessidades de mão de obra foram sempre uma fonte de preocupações da coroa portuguesa e dos privados. Foram mesmo um dos motivos que estiveram na origem da conquista de Ceuta em 1415, que era uma zona de confluência de várias rotas, muitas delas de escravos, que seriam importantes para suprir a penúria de mão de obra do Reino. Durante algum tempo, os escravos chegaram a ser mais importantes que o ouro, para além de obtenção mais fácil e menos dispendiosa, como disse já A. H. Oliveira Marques. Os primeiros escravos a chegar à Europa nos séculos XIV e primeira metade do século XV eram oriundos das Canárias, tendo sido procurados por castelhanos, franceses e italianos talvez antes dos Portugueses. A costa ocidental africana foi a área de proveniência seguinte, dadas as dificuldades experimentadas na captura dos Canários, aguerridos e difíceis de aprisionar, para além do seu número ter decrescido imenso e da pirataria e concorrência de outras nações nas águas canárias terem também afastados os navegadores portugueses. A questão sobre a posse das ilhas estava também acesa, o que dificultava as operações.
Os proventos do tráfico de escravos eram generosos e os Portugueses logo se lançaram para a costa africana, que conheciam melhor - e quase exclusivamente - e, para além do ouro, empreenderam a captura de escravos, os quais pontualmente comerciavam com negreiros muçulmanos. O crescimento da produção de açúcar na Madeira nas décadas de 60-70 do século XV incentivara ainda mais a captura e tráfico de escravos, que se complementava com a revenda para Castela e outros reinos europeus. A captura de escravos marroquinos era perigosa e, portanto, era imperativo mesmo a aposta na costa africana para a sua obtenção. Os primeiros negros foram trazidos da Mauritânia em 1441 por Antão Gonçalves, fazendo com que três anos depois várias caravelas algarvias se tivessem lançado para a costa africana em busca de escravos. Na década de 1450 afluía já uma média de 700-800 escravos por ano ao Reino, que depois eram quase todos canalizados para a Europa, via Lagos ou Lisboa. Parte deles eram obtidos em incursões no interior de África, outra parte comprados a traficantes muçulmanos, como se viu. Todo este comércio português de escravos atraiu para Lisboa e Lagos comerciantes de Itália, de outros reinos ibéricos e do Norte da Europa, tal era a sua importância para a economia europeia e os lucros que se obtinham.
Em Portugal o número de escravos era considerável, embora alguns autores dos séculos XV e XVI tenham exagerado o seu número, que nunca terá ultrapassado a percentagem de 5-7% da população portuguesa nessas centúrias (cerca de 1-1,5 milhões de almas, talvez nem tanto). Eram vistos principalmente em Lisboa, cidade onde afluíam mais estrangeiros e viviam mais letrados, logo a imagem que se lhes oferecia era a de um pulular de escravos no País. Oliveira Marques calculou, com base na média de 750 por ano, uma cifra de 41 250 escravos traficados pelos portugueses entre 1450 e 1505, ainda que o mesmo autor tenha defendido que esse número não tenha ultrapassado talvez os 25-30 000 na realidade a afluírem à Europa e colónias portuguesas.
No século XVI, no apogeu do Império português do Oriente, os escravos eram a terceira mais importante mercadoria, depois das especiarias e do ouro. Encontravam-se em toda a costa de África, tanto no Atlântico como no Índico, mas os da Guiné e do Congo/Angola eram os que maior percentagem ocupavam no tráfico. Os destinos eram a Madeira, Cabo Verde, S. Tomé e Brasil, esta colónia a que acabaria por ser o maior sorvedouro desta mão de obra à escala planetária, onde a escravatura foi um dos alicerces da sua economia e desenvolvimento a todos os níveis. Na Ásia, a procura de escravos era também assinalável, mas estes obtinham-se quase sempre em várias regiões daquele continente, principalmente em Java (como o jau de Camões), noutras ilhas da Insulíndia, na Indochina e pontualmente em certas regiões da Índia meridional. Mas a maior parte destes escravos asiáticos ficavam principalmente na Índia Portuguesa e noutros entrepostos lusos na Ásia, como Malaca ou Macau, já que as autoridades desencorajavam o seu tráfico para a Europa, que foi reduzido.
O século XVI foi o século de maior afluência de escravos a Portugal. Na centúria seguinte, o número de escravos importados baixou sensivelmente na Metrópole (dado o seu preço ser elevadíssimo, ainda que o seu número fosse apreciável, incluindo africanos, asiáticos e mouros), em oposição ao que se passava no Brasil, onde cresceu sempre até ao século XVIII, incentivado pelos ciclos económicos sucessivos e que exigiam grandes quantidades de mão de obra, já que a indígena se revelou insuficiente e sem capacidade física. O açúcar, depois o ouro e os diamantes, os três grandes ciclos brasileiros, ditaram um dos maiores movimentos migratórios (forçados, claro) da história da Humanidade, da África para o Brasil durante quase três séculos, para as minas e para as fazendas, para as casas senhoriais e para as cidades. Como sucedeu também noutros lugares, como S. Tomé e Príncipe, numa escala mais reduzida, cujas ilhas foram colonizadas por escravos angolares. Idênticos fluxos esclavagistas demandavam, a partir da costa da Guiné, do Congo/Angola (depois de 1660, também de Moçambique) para a América espanhola, as Antilhas Holandesas, Francesas e Inglesas e a América do Norte, que ombreou com o Brasil na atração de mão de obra africana. As condições de transporte eram duríssimas, sucumbindo muitos à viagem (às vezes metade do carregamento). Eram batizados antes de partirem. Calcula-se que terão aportado ao Brasil mais de meio milhão de escravos entre 1570 e 1670. Com o ouro e os diamantes, este número disparou ainda mais. Em finais do século XVII, a média anual rondaria os 20 000 escravos por ano. Entre 1700 e 1820, calculam-se mais de dois milhões de escravos entrados no Brasil.
Todo este lucrativo tráfico fez com que os negreiros descurassem o mercado europeu, que não pagava tão bem quanto os das colónias nem necessitava de levas constantes de tantos efetivos transportados, para além de sucessivos decretos tentarem interromper a vinda para Portugal de mão de obra escrava. De recordar, entretanto, que no século XVII, existiam ainda escravos mouros em Portugal, embora a sua importação estivesse interditada desde finais do século XVI. Em Portugal, a importação de escravos diminuiu sempre até quase assumir proporções insignificantes por altura do governo de Pombal, a meio do século XVIII, começando o problema da condição humana dos escravos a invadir as mentalidades e a cultura da época, fortemente iluminada pela Razão e pelos direitos humanos em alguns setores importantes da sociedade, alguns já anti-esclavagistas.
Os proventos do tráfico de escravos eram generosos e os Portugueses logo se lançaram para a costa africana, que conheciam melhor - e quase exclusivamente - e, para além do ouro, empreenderam a captura de escravos, os quais pontualmente comerciavam com negreiros muçulmanos. O crescimento da produção de açúcar na Madeira nas décadas de 60-70 do século XV incentivara ainda mais a captura e tráfico de escravos, que se complementava com a revenda para Castela e outros reinos europeus. A captura de escravos marroquinos era perigosa e, portanto, era imperativo mesmo a aposta na costa africana para a sua obtenção. Os primeiros negros foram trazidos da Mauritânia em 1441 por Antão Gonçalves, fazendo com que três anos depois várias caravelas algarvias se tivessem lançado para a costa africana em busca de escravos. Na década de 1450 afluía já uma média de 700-800 escravos por ano ao Reino, que depois eram quase todos canalizados para a Europa, via Lagos ou Lisboa. Parte deles eram obtidos em incursões no interior de África, outra parte comprados a traficantes muçulmanos, como se viu. Todo este comércio português de escravos atraiu para Lisboa e Lagos comerciantes de Itália, de outros reinos ibéricos e do Norte da Europa, tal era a sua importância para a economia europeia e os lucros que se obtinham.
Em Portugal o número de escravos era considerável, embora alguns autores dos séculos XV e XVI tenham exagerado o seu número, que nunca terá ultrapassado a percentagem de 5-7% da população portuguesa nessas centúrias (cerca de 1-1,5 milhões de almas, talvez nem tanto). Eram vistos principalmente em Lisboa, cidade onde afluíam mais estrangeiros e viviam mais letrados, logo a imagem que se lhes oferecia era a de um pulular de escravos no País. Oliveira Marques calculou, com base na média de 750 por ano, uma cifra de 41 250 escravos traficados pelos portugueses entre 1450 e 1505, ainda que o mesmo autor tenha defendido que esse número não tenha ultrapassado talvez os 25-30 000 na realidade a afluírem à Europa e colónias portuguesas.
No século XVI, no apogeu do Império português do Oriente, os escravos eram a terceira mais importante mercadoria, depois das especiarias e do ouro. Encontravam-se em toda a costa de África, tanto no Atlântico como no Índico, mas os da Guiné e do Congo/Angola eram os que maior percentagem ocupavam no tráfico. Os destinos eram a Madeira, Cabo Verde, S. Tomé e Brasil, esta colónia a que acabaria por ser o maior sorvedouro desta mão de obra à escala planetária, onde a escravatura foi um dos alicerces da sua economia e desenvolvimento a todos os níveis. Na Ásia, a procura de escravos era também assinalável, mas estes obtinham-se quase sempre em várias regiões daquele continente, principalmente em Java (como o jau de Camões), noutras ilhas da Insulíndia, na Indochina e pontualmente em certas regiões da Índia meridional. Mas a maior parte destes escravos asiáticos ficavam principalmente na Índia Portuguesa e noutros entrepostos lusos na Ásia, como Malaca ou Macau, já que as autoridades desencorajavam o seu tráfico para a Europa, que foi reduzido.
O século XVI foi o século de maior afluência de escravos a Portugal. Na centúria seguinte, o número de escravos importados baixou sensivelmente na Metrópole (dado o seu preço ser elevadíssimo, ainda que o seu número fosse apreciável, incluindo africanos, asiáticos e mouros), em oposição ao que se passava no Brasil, onde cresceu sempre até ao século XVIII, incentivado pelos ciclos económicos sucessivos e que exigiam grandes quantidades de mão de obra, já que a indígena se revelou insuficiente e sem capacidade física. O açúcar, depois o ouro e os diamantes, os três grandes ciclos brasileiros, ditaram um dos maiores movimentos migratórios (forçados, claro) da história da Humanidade, da África para o Brasil durante quase três séculos, para as minas e para as fazendas, para as casas senhoriais e para as cidades. Como sucedeu também noutros lugares, como S. Tomé e Príncipe, numa escala mais reduzida, cujas ilhas foram colonizadas por escravos angolares. Idênticos fluxos esclavagistas demandavam, a partir da costa da Guiné, do Congo/Angola (depois de 1660, também de Moçambique) para a América espanhola, as Antilhas Holandesas, Francesas e Inglesas e a América do Norte, que ombreou com o Brasil na atração de mão de obra africana. As condições de transporte eram duríssimas, sucumbindo muitos à viagem (às vezes metade do carregamento). Eram batizados antes de partirem. Calcula-se que terão aportado ao Brasil mais de meio milhão de escravos entre 1570 e 1670. Com o ouro e os diamantes, este número disparou ainda mais. Em finais do século XVII, a média anual rondaria os 20 000 escravos por ano. Entre 1700 e 1820, calculam-se mais de dois milhões de escravos entrados no Brasil.
Todo este lucrativo tráfico fez com que os negreiros descurassem o mercado europeu, que não pagava tão bem quanto os das colónias nem necessitava de levas constantes de tantos efetivos transportados, para além de sucessivos decretos tentarem interromper a vinda para Portugal de mão de obra escrava. De recordar, entretanto, que no século XVII, existiam ainda escravos mouros em Portugal, embora a sua importação estivesse interditada desde finais do século XVI. Em Portugal, a importação de escravos diminuiu sempre até quase assumir proporções insignificantes por altura do governo de Pombal, a meio do século XVIII, começando o problema da condição humana dos escravos a invadir as mentalidades e a cultura da época, fortemente iluminada pela Razão e pelos direitos humanos em alguns setores importantes da sociedade, alguns já anti-esclavagistas.
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Como referenciar
Porto Editora – Comércio de Escravos na Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora. [consult. 2025-01-23 21:02:47]. Disponível em
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